segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

Plástico Bolha



Hoje, meu poema "Parking" foi publicado no blog do jornal Plástico Bolha!

Pra quem não conhece, é um jornal de distribuição gratuita (em mais de 10 Estados do Brasil) que busca divulgar a literatura e conta com a colaboração de autores novos e consagrados.


Confira o link:

 http://jornalplasticobolha.blogspot.com.br/2013/12/parking.html

domingo, 15 de dezembro de 2013

Mar e mais nada.






Paz

 

O mar
é cadência
de choro
rock
e blues.

O mar
é sequência
de onda
espuma
e praia.

O mar
é dono
do céu
de sal no qual
o sol espraia.

O mar
é dono
do mundo
de si
e de nós

e quando estamos
sós
o mar é lar
e não há lugar
como o nosso mar!



Fernanda Tinoco Ramos

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

AMOR (no dia delas!)


Manual prático da língua portuguesa

(para meus pais e Carolina)


Se estiver triste, diga chateado, frustrado, decepcionado, desapontado.

Se estiver cansado, diga desanimado, pra baixo, abatido.
Desenho sem título - Leonardo Etero

Se quiser comer, diga fome, faminto, verde.

Se quiser dormir, diga cama, sono, fadigado.

Se quiser fazer xixi, diga banheiro, sanitário, toalete; ou diga só xixi

(sim, os primeiros termos se aplicam a outras necessidades).

Se estiver com calor, diga banho de mar, água com gás, vento nos cabelos.

Se estiver com frio, diga casaco, manta, meia, chocolate quente.

Se estiver feliz, diga alegria, contentamento, animado, empolgado.

Se estiver com medo, diga paralisado, horror, pavor, terror e, por último, diga “XÔ!”.

Se estiver em paz, diga calma, harmonia, livre, sossegado, obrigado.

Se for grato, diga amor. Diga somente amor e ponto.


Amor (ô) sm. Palavra sem sinônimo que pode ser pronunciada, silenciosamente, por mil gestos.


Grata!
Fernanda Tinoco Ramos

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

Sobre existir...


Sobre a existência em dois tempos
 

I.
Blasé
Desenho "pé-pé" - Leonardo Etero
bege
o nu do nude:
completa solidão.

Prefiro o vermelho
carne crua
revela
expõe
fere
mas mexe
de qualquer forma
na emoção.

II.
Transe:
traço raso
de si mesmo.

Traga um rasto
(mesmo efêmero)
vasto
da beleza dos começos.


Fernanda Tinoco Ramos

terça-feira, 29 de outubro de 2013

Linha tênue


                                                                                myself & myego


Escultura "Cabeça de Vento" - Leonardo Etero
Sobre as solas dos pés: eu;
sob as solas dos pés: o chão;
as pegadas fazem a união.

Diante do espelho: eu;
do outro lado: a projeção;
os olhares fazem a divisão.
    

Fernanda Tinoco Ramos


terça-feira, 22 de outubro de 2013

Sem palavras




(Sem título)




Não existem palavras suficientes
Desenho sem título - Leonardo Etero
nos dicionários.
Preciso de todos os pingos nos is
todas as letras
todos os hifens e tremas
da antiga ortografia
reunidos em pratos limpos
para devorá-los e quem sabe
conseguir meia palavra que seja
capaz de expressar essa sensação
não batizada.
Queria subir no palanque e falar
pra todo mundo
que a partir de hoje
essa sensação tem nome
e acabar de vez
com esse nó na garganta.
Bom seria ter respostas
na ponta da língua que acalmassem
a boca do estômago!
Mas não as tenho
faz tempo que não me ocorre nada
além do recurso de
engolir em seco e gritar
debaixo d’água.




Fernanda Tinoco Ramos

quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Qual a parte que te cabe?





(Sem título)

Desenho "segura firme" - Leonardo Etero



Para as críticas sem senso crítico,
para os críticos que não bancam a conta,
simplicidade não é simplismo
e o que conta não é o que você conta,
é o que você faz (sem usar a voz)...
Nem toda vítima precisa de algoz.
Não é culpa da rótula o comodismo,
Detalhe do desenho "segura firme" -
Leonardo Etero
também não se culpa o paladar pelo dissabor.
Não rotulemos a rótula,
nem coloquemos palavras na boca do paladar!
Por favor, cada coisa em seu devido lugar:
a cada um, aquilo que está disposto a dar.



Fernanda Tinoco Ramos

terça-feira, 15 de outubro de 2013

Jungle twice






Romance mercenário
Desenho "Vai dobrar ou vai meter o pé?" - Leonardo Etero
ou mais-valia



Me decifra
ou
eu te devoro!

Me dê cifra
ou
eu te depeno!



Fernanda Tinoco Ramos


  

                                                                                                                                                                               


Desenho "segue o fluxo" - Leonardo Etero
Metrópole
                                       

                                 
Tire seu sorriso do caminho
que EU quero passar
com a minha dor.

Tire sua bicicleta do caminho

que EU quero passar
com o meu trator.


Fernanda Tinoco Ramos
                                                          


                                                         









sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Para a minha criança.


MEL


Na sala éramos apenas eu e ela. Ela me fitava com precisão, como se enxergasse em mim todos os sinais que vão muito além da visão. Por vezes piscava lentamente e depois piscava de novo e de novo, e de tanto piscar, com as pálpebras pesadas, acabou caindo no sono. Mas ao menor movimento ela acordou, arregalou os olhos, suspendeu a cabeça com as orelhas de pé e voltou a me fitar como se dissesse, com seus enormes olhos cor de mel, saber muito sobre mim, como quem conhecesse muito mais do mundo do que permitiam seus 18 meses de vida. Eu, analisando-a minuciosamente, me perguntava: quem sabe mais? Ela também me olhava, mas não se perguntava nada, porque não precisa de indícios, provas ou respostas.
retrato da Mel - Leonardo Etero


Fernanda Tinoco Ramos

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Brincando com fogo.

"o tempo
entre o sopro
e o apagar da vela"

Paulo Leminski




Ciranda da centelha
Instalação "devoção devoluta" + fósforos -
Leonardo Etero



Bem me lembro...
Era noite de ciranda
o povo dançava
e no calor de dezembro
a alegria fez-se chama.
Uma centelha
do meio da roda  –  
sem juízo e sem jeito –
chamou-me na orelha
(“Anda, aproveita o acaso!”)
e me queimou o peito.
Tamanho o espanto
que a retina escureceu,
a cabeça (zonza) rebateu:
– Logo eu,
aqui na quina,
pra centelha acertar na telha?!
Retomando a visão sua feição
suavemente
tomou forma e eu tomei
do seu cheiro de alecrim.
As palavras da centelha ecoavam na cabeça (zonza):
“Anndaaa, aproveeiiittaaa o acaaasooo!”;
mas o coração vidente
já ciente anunciava:
– Acaso foi tudo que
não aconteceu no nosso caso.


Fernanda Tinoco Ramos


quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Os dois pontos da questão.



Desenho "Retrovisão" - Leonardo Etero



Parking


Sem mais a intenção

de chegar antes da hora

por agora parei em ponto morto

em zona confortavelmente indolor

onde descansa em paz sua imagem

no ponto cego do meu retrovisor.



Fernanda Tinoco Ramos

terça-feira, 1 de outubro de 2013

TIC TAC TIC TAC...




 O certo da vida

Desenho "BLESC BLOM" - Leonardo Etero

Não gosto das horas certas, precisas, bem ajustadas,
meio-dia, meia-noite,
“te vejo às 8 às 22 às 15 horas”.
A vida não é feita de horas certas
mas de atrasos e adiantamentos 
não atrasos exatos: de 5, 10 ou 15 minutos 
de atrasos frouxos... 7, 18, 23 minutos...

Não gosto das horas certas,
elas só funcionam nos contos de fadas
(“À meia-noite a carruagem vira abóbora.”),
na vida do dia a dia as horas são soltas
tudo é imprevisível:
o trânsito, o humor, o clima,
os encontros (desencontros)

(...)

e também a rima (E não é que ela veio?!).

Tá bom, a hora certa talvez exista no Reino Unido;
já nos outros cantos a hora certa
não é a do relógio
é a hora do destino. Destino?
Ou será a hora da leveza?
Talvez seja.

Desconfio dos planos infalíveis
com prazos e termos finais,
me parecem muito instáveis.
A hora certa não é
meio-dia, meia-noite; nem
“te vejo às 8 às 22 às 15 horas”.
A hora certa é aquela que tinha que ser.

A vida é feita do que tinha que ser
e não do que teria sido.



Fernanda Tinoco Ramos


domingo, 29 de setembro de 2013

O sonho de ser mais.

Desenho sem título - Leonardo Etero





O que eu queria ter sido 



Um nome para o que eu sou, importa muito pouco. Importa o que eu gostaria de ser.

O que eu gostaria de ser era uma lutadora. Quero dizer, uma pessoa que luta pelo bem dos outros. Isso desde pequena eu quis. Por que foi o destino me levando a escrever o que já escrevi, em vez de também desenvolver em mim a qualidade de lutadora que eu tinha? Em pequena, minha família por brincadeira chamava-me de "a protetora dos animais". Porque bastava acusarem uma pessoa para eu imediatamente defendê-la. E eu sentia o drama social com tanta intensidade que vivia de coração perplexo diante das grandes injustiças a que são submetidas as chamadas classes menos privilegiadas. Em Recife eu ia aos domingos visitar a casa de nossa empregada nos mocambos. E o que eu via me fazia como que me prometer que não deixaria aquilo continuar. Eu queria agir. Em Recife, onde morei até doze anos de idade, havia muitas vezes nas ruas um aglomerado de pessoas diante das quais alguém discursava ardorosamente sobre a tragédia social. E lembro-me de como eu vibrava e de como eu me prometia que um dia esta seria a minha tarefa: a de defender os direitos dos outros.

No entanto, o que terminei sendo, e tão cedo? Terminei sendo uma pessoa que procura o que profundamente se sente e usa a palavra que o exprima.

É pouco, é muito pouco.


Clarice Lispector, in "Crônicas para jovens: de bichos e pessoas"



quinta-feira, 26 de setembro de 2013

A permanência é uma ilusão...



"A permanência é uma ilusão. Somente a mudança é real.
 É impossível pisar duas vezes no mesmo rio"
Heráclito




Ciclos



Sabe, de morrer eu entendo,
Desenho sem título - Leonardo Etero
Frase extraída do poema "Barro" de Cláudio Bento - MG
já nasci muitas vezes
em tempos de seca
em dias de luto...

Sabe, de nascer eu entendo,
já morri muitas vezes
em tempos de baile
em dias de santo...

Olha, de morrer eu entendo,
já morri muitas vezes
apegando às mágoas
acumulando bens.

Olha, de nascer eu entendo,
já nasci muitas vezes
renunciando mágoas
acumulando o bem.

Sabe, de nascer eu entendo,
já morri muitas vezes
de alegria de juventude de saúde...

Sabe, de morrer eu entendo,
já nasci muitas vezes
de tristeza de velhice de doença...

Olha, de morrer eu entendo
de nascer também;
já nasci muitas vezes
outras vezes morri...
E quase que diariamente
eu morro em mim e nasço em você
e quase que regularmente
eu nasço em mim e morro em ti.


Fernanda Tinoco Ramos 

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Presente de Carolina!



Detalhe da escultura "pé-pé" ou "eu não tenho medo" - Leonardo Etero
CAROLINA


um palito separa
o prazer da dor
um ponto separa
o prazer da dor
é como se você
estivesse numa e
s
c
a
d
a
de três degraus
1
2
3
e do degrau
do meio,
um degrau pra cima
é o prazer
um degrau pra baixo
dor.
aí eu pergunto
onde dói mais
onde dói menos
e porque me sinto feliz
e triste
ao mesmo tempo.


Bruna Beber, in "A fila sem fim dos demônios descontentes"



sábado, 21 de setembro de 2013

À espera de mudanças.





Desenho sem título - Leonardo Etero
Espera


A primavera vai voltar
e logo virá o natal e depois
o ano novo e o cheiro de mato seco
vai invadir a casa.


As horas vão passar;
a vida viaja em ciclos
eu vou envelhecer
e as horas vão passar –
dia após dia
semana após semana
mês após mês –
mais um ano vai passar.


A primavera vai voltar
e com ela as cores o calor
um ligeiro cheiro de mato seco;
e quando o verão chegar o cheiro
vai invadir a casa.


Circunstâncias mudam de lugar
mas certos discos sempre vão tocar e eu
vou esperar ao som de Tom Jobim.


Mais uma primavera
está de volta e só você não volta
pra mim.



Fernanda Tinoco Ramos
 


sexta-feira, 20 de setembro de 2013

O prato do dia: as palavras também alimentam.




A poesia do dia

 
Desenho "Bloom" - Leonardo Etero
Sonho em tirar a poesia do caderno
levá-la pra ver o mundo.

Sonho com a poesia concreta  –  
não a dos concretistas nem a de concreto
barro tinta plástico ferro...
como se vê em tantas obras de arte obras de rua.

Sonho em pegá-la pela mão
puxá-la do fundo do papel ofício
ou do microsoft office
e carregá-la comigo nas 24 horas;

e nos fins de semana conduzi-la
delicadamente à beira do mar;
e nos dias de chuva permitir
que as gotas caiam em sua testa
molhem suas lágrimas;
e nas noites dos dias longos cantar músicas
de ninar desejando que ela nunca durma...

Sonho com a poesia concreta que resgato
do fundo da folha e ponho
no fundo do olho. Quero a poesia que vai da tela touch
para lente de contato. Poesia lente de aumento.


Fernanda Tinoco Ramos 


quinta-feira, 19 de setembro de 2013

Abrindo os trabalhos!

Para abrir, conto com o auxílio de Quintana. Já que é para explorar abismos...



Escadas


Desenho "Escadas Enrolantes" - Leonardo Etero
Escadas de caracol
Sempre
São misteriosas, conturbam...
Quando as desce, a gente
Se desparafusa...
Quando a gente as sobe
Se parafusa
             o peito
                        estreito
                                  o teto descendo
Descendo descendo como nas histórias de imortal horror!
Mas de que jeito,
Mas como pode ser,
Morrer cair rolar por uma escada de parafuso?
Além disso não têm, pelo o que dizem, nenhuma acústica...
Oh! não há como as escadarias daqueles antigos edifícios públicos
Para ser assassinado...
Porém não fiques tão eufórico,
 nem tudo são rosas:
Há,
No sonho das velhas casas de cômodos onde moras,
Passos que vêm subindo degrau por degrau em direção ao teu quarto
E "sabes" que é um fantasma chamejante e fosfóreo
 o corpo todo feito de inconsumíveis labaredas verdes!
O melhor
mesmo
É fechar os olhos
E pensar numa outra coisa...
Pensa, pensa
 o quanto antes!
Naquelas pobres escadas de madeira das casas pobres
– escurinho dos teus primeiros aconchegos...
Pensa em cascatas de risos
Escada abaixo
De crianças deixando a escola...
Pensa na escada do poema
Que tu
          comigo
                     vens descendo
                                             agora...
(Hoje em dia todas as escadas são para descer)
Mas não! este poema não é
Nenhum
Abrigo
Antiaéreo...
Ah, tu querias que eu te embalasse?!
Eu estava, apenas, explorando uns abismos...


Mario Quintana, in "Antologia poética".